Tenho visto muitos homens reclamarem que não se pode mais paquerar. Que tudo agora é importunação sexual.

Não me estranha um macho se escudar no deslimite para tentar confundir aquilo que é humano com a desumanidade da ação humana.

A paquera está na sensibilidade de dois seres humanos que se consentem ao encantamento recíproco, como numa troca de olhares ou num sorriso tímido.

Mas como fazer para reaprender a paquera sem importunar o outro?

Se volte para as lendas de nossos povos ancestrais e passe a tratar a natureza como parte de uma história de amor em que nasce a vida.

A mulher prateada era uma lua e o homem dourado, um sol. Um paixão ardente, mas impossível, pois da sua união o mundo acabaria.

A lua chorou muito e suas lágrimas escorreram para o mar, mas o mar não podia aceitar aquelas lágrimas de tristeza.

As lágrimas da lua cavaram um vale e lá ficaram, formando o Rio Amazonas.

E aprenda com Quintino Cunha a dizer:

“Que Amazonas de amor não sairia

De mim, de ti, de nós que nos amamos!…”

Mas se mesmo assim você não aprendeu a diferença entre o que é importunar o outro e o que é uma paquera, mergulhe na literatura brasileira e descubra o amor de seus personagens.

Em Vidas Secas, do velho Graça, você se encantará com a cumplicidade de Fabiano e Sinhá Vitória. Uma história de amor além do sofrimento imposto pela injustiça.

Em Capitães da Areia, de Jorge Amado, você verá o nascer do amor entre Pedro Bala e Dora. Aqui você vai aprender que garotos de rua sabem amar com respeito e proteção mútua.

Com Machado de Assis, você conhecerá Bentinho e Capitu e verá que não importa se Capitu traiu ou não. Capitu tomou conta do coração do Dom Casmurro.

Se ainda persistir sua dificuldade de paquerar com o coração e não com a importunação da violência desmedida, recite uns versos do Drummond.

“O mundo é grande e cabe nesta janela sobre o mar. O mar é grande e cabe na cama e no colchão de amar. O amor é grande e cabe no breve espaço de beijar.”

Mas se com tudo isto você não aprendeu a diferença entre importunar uma mulher e paquerá-la, o Inferno de Dante te aguarda no Puraquequara.

 

 

Lúcio Carril

Sociólogo

Imagem: PIXABAY