Comitiva do Governo Federal se reuniu com os povos Puri, Tupiniquim e Guarani para explicar a parte do acordo, com valor de R$8 bilhões, voltada à reparação de danos coletivos aos indígenas, quilombolas e povos tradicionais

Acompanhado de representantes de diversas pastas do Governo Federal, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) realizou um novo ciclo de explicações sobre o Novo Acordo da Bacia do Rio Doce em comunidades Puri, localizadas em Minas Gerais (na terça-feira, dia 25 de março), e em comunidades Tupiniquim e Guarani, no Espírito Santo (na quarta-feira e quinta-feira, dias 26 e 27). A Caravana Interministerial, coordenada pela Secretaria-Geral da Presidência da República (SG-PR), destinou uma equipe aos territórios para detalhar junto aos indígenas a parte do acordo, com valor de R$8 bilhões, voltada à reparação de danos coletivos aos indígenas, quilombolas e povos tradicionais causados pelo rompimento da Barragem de Fundão, em 2015.

“Nesta ocasião, a vinda de representantes da União não tem caráter nenhum de consulta em relação ao aceite ou não dos povos indígenas ao Novo Acordo. Viemos nivelar informações e combater fake news. Em acréscimo, nos foi colocada a necessidade de discutir o Novo Acordo além do Anexo 3, para que as demais políticas e programas de responsabilidade do Governo, as quais os povos indígenas afetados têm acesso, sejam devidamente apresentadas”, detalhou Jarbas Vieira da Silva, diretor da Secretaria Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas, da SG-PR.

A distribuição dos valores destinados aos povos indígenas seguirá o modelo decidido pelas próprias comunidades e deverá ser construído durante o processo de consulta, elencando prioridades conforme demanda real do território e conforme os arranjos que as comunidades decidirem. Os montantes serão depositados no decorrer de 20 anos e poderão ser empregados em projetos construídos com a participação e anuência dos indígenas. Caso aceitem a proposta do Governo, estão previstos mais de R$108 milhões para atender os Puri e R$1,59 bilhão para os Tupiniquim e Guarani. A verba será investida em Assessorias Técnicas Independentes (ATIs), auxílio financeiro, diagnóstico de danos e medidas estruturais coletivas.

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Nas reuniões, além de distribuir cartilhas referente ao Novo Acordo aos indígenas, agentes públicos deram explicações sobre aportes e ações previstas para cada pasta e ouviram demandas e dúvidas dos indígenas

“O Governo Federal segue respeitando o período de prestação de esclarecimentos sobre o Novo Acordo com duração de 18 meses após sua homologação, que ocorreu em outubro de 2024. As apresentações servem para sentirmos qual é a percepção dos indígenas sobre o pacto diante de um anexo inédito, que nem sequer constava no acordo da gestão passada. Ainda há muitas dúvidas dentro das comunidades que precisam ser esclarecidas, principalmente sobre o acesso aos programas para cada território”, ressaltou Bruno Potiguara, diretor do Departamento de Gestão Ambiental Territorial e Promoção do Bem Viver Indígena do MPI.

As apresentações servem para sentirmos qual é a percepção dos indígenas sobre o pacto diante de um anexo inédito, que nem sequer constava no acordo da gestão passada. Ainda há muitas dúvidas dentro das comunidades que precisam ser esclarecidas, principalmente sobre o acesso aos programas para cada território
BRUNO POTIGUARA
Diretor do Departamento de Gestão Ambiental Territorial e Promoção do Bem Viver Indígena do MPI

ANEXO EXCLUSIVO PARA IPCT — O acordo que seria assinado em 2022 não garantia recursos específicos para os povos indígenas. Além disso, extinguia quase todas as obrigações das empresas envolvidas, não previa a retirada de rejeitos de mineração e instituía o fim do monitoramento de áreas atingidas pelo crime ambiental de responsabilidade da Samarco, BHP e Vale. Com valor de R$65 bilhões, o pacto inicial também não apresentava programas de indenizações para os afetados e concentrava recursos em infraestrutura e nas unidades federativas impactadas.

Diferente dos termos citados, o pacto atual possui um anexo exclusivo para priorizar Indígenas, Povos e Comunidades Tradicionais (IPCTs). O Novo Acordo ainda conta com um anexo de transição em decorrência de várias ações paralisadas nos territórios pela Fundação Renova, que é de inteira responsabilidade das empresas que perpetraram o crime ambiental e versa sobre medidas a serem executadas, como o fornecimento de água mineral, a construção de poços artesianos e questões ligadas ao Plano Básicos Ambientais Indígenas (PBAIs). O processo de consulta junto aos indígenas se encerra em março de 2026.

Andressa Lewandowski, assessora técnica do Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas (DEMED) do MPI, explicou em todas as comunidades e aldeias visitadas que, diferente dos demais anexos da repactuação, o Anexo 3 trata de uma proposta aos IPCTs. Se após o processo de saneamento de dúvidas for aceito, os R$8 bilhões serão divididos em três eixos fundamentais. Ao todo, o acordo possui 18 anexos.

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Distribuição dos valores destinados aos povos indígenas seguirá o modelo decidido pelas próprias comunidades

O primeiro é de verba assistencial para o período de 18 meses após a homologação, prazo que coincide justamente com o período de realização da consulta aos povos. Há a previsão de mais 72 meses de verba assistencial por unidade familiar, se as comunidades em conjunto decidirem que a proposta do governo as contempla. O segundo é o das ATIs, no valor de R$698 milhões — dentro dos moldes que as comunidades determinarem para se manterem informadas e acompanharem o processo de reparação — e o terceiro eixo funciona para medidas estruturantes coletivas e dirigidas aos territórios, mediante a indicação de impactos a serem reparados em modelo de autogestão pelos próprios indígenas acompanhada pela União.”Se o Novo Acordo não for aceito pelas comunidades indígenas, as obrigações de fazer e contemplar as medidas estruturantes, verbas assistenciais e etc., retornam para as empresas executá-las em vez da União. A ideia é que se possa discutir e tirar todas as dúvidas, entender de maneira global como os outros anexos contemplam as comunidades, já que o MPI e a Funai fazem a mediação com os demais ministérios envolvidos em função do contato direto com os territórios. É importante frisar que independente da aceitação do anexo 3 em si, os povos indígenas ainda têm direito de serem atendidos pelas medidas dos demais ministérios que participam do Novo Acordo”, destacou a assessora.

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INVESTIMENTOS — Em todas as reuniões, além de distribuir cartilhas referente ao Novo Acordo para os indígenas, representantes do MPI, da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), da SG-PR, dos ministério da Saúde (MS), do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), da Educação (MEC), do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e da Pesca e Aquicultura (MPA) deram explicações sobre os aportes e ações previstos para cada pasta e ouviram as demandas e dúvidas dos indígenas.

Com coordenação do MS, R$12 bilhões estão previstos para a instituição do Programa Especial de Saúde do Rio Doce no SUS. O MDS conta com R$640 milhões para o fortalecimento da assistência social. O MEC possui R$2 bilhões para ações no campo da educação e o MPA tem R$2,4 bilhões para a política de pesca, por exemplo.

INCURSÕES EM TERRITÓRIOS INDÍGENAS — Na terça (25), a Equipe 3 da Caravana se dedicou a ouvir e dialogar com diferentes grupos dos Puri, que chegaram a ser considerados extintos, e compareceu a reuniões nas Comunidades Uchô Betháro Puri, em Aimorés-MG, e à Puki, em Resplendor-MG, onde encontraram cerca de 30 e 50 indígenas de contexto urbano, respectivamente. À tarde, a Aldeia Krim Orutu, território de retomada de outro grupo Puri ao norte do município de Itueta, recebeu integrantes da Caravana em um encontro com aproximadamente 100 pessoas.

No dia seguinte, a Equipe 3 foi a um encontro na Cabana Central que reuniu por volta de 50 lideranças e representantes de comunidades da Terra Indígena Comboios, homologada em 1998, que possui em seu território a aldeia de Comboios e a aldeia do Córrego do Ouro, ambas no município de Aracruz-ES. Com cerca de quatro mil hectares, a TI Comboios é habitada pelo povo Tupiniquim e está situada na Mata Atlântica. Nela habitam 928 pessoas, distribuídas em 276 famílias. A equipe foi recebida por uma comitiva de nove lideranças indígenas locais, que conduziu a equipe por pontos da região para mostrar áreas impactadas diretamente pelo rompimento da Barragem de Fundão e que têm afetado os modos de vida indígena local.

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Caso aceitem a proposta, estão previstos mais de R$108 milhões para atender os Puri e R$1,59 bilhão para os Tupiniquim e Guarani – Fotos: Rony Eloy / MPI

Já na quinta-feira (27), a primeira reunião do dia ocorreu na aldeia Olho D’Água, dos Guarani, com a Comissão de Caciques Tupiniquim e Guarani. Cerca de 40 pessoas, entre elas lideranças, secretários, coordenadores de associações e moradores da aldeia citada e demais aldeias das imediações, entre elas Piraquê Açu, Nova Esperança/Ka’aguy Porã, Boa Esperança e Areal, conversaram com o Governo Federal.

À tarde, a Equipe 3 chegou à aldeia Caieiras Velha para a reunião com o Conselho Territorial dos Tupiniquim e Guarani, com um quórum de aproximadamente 110 pessoas, entre elas indígenas Tupiniquim e Guarani. O Conselho representa quatro aldeias: Caieiras Velha, Irajá, Três Palmeiras e Pau-Brasil, sendo a primeira delas a maior, abrangendo 35% do território da Terra Indígena Tupiniquim Guarani, homologada em 2010.

PRÓXIMOS PASSOS — De acordo com Elis Nascimento, assessora da Secretaria de Gestão Ambiental e Territorial Indígena e diretora substituta do Departamento de Justiça Climática (DEJUC) do MPI, os próximos passos do Governo Federal são: definir junto aos indígenas o cronograma de ações relacionadas à construção do termo de referência das ATIs, retomada das ações que estão no anexo de transição que envolvem os povos indígenas e esclarecimentos sobre o anexo 3 para que sejam devidamente consultados sobre a adesão ao Novo Acordo da Bacia do Rio Doce.

“O crime ambiental afetou a relação intrínseca que os povos têm com seus territórios e os prejudicou nas práticas de agricultura, pesca, tradicionalidade, espiritualidade e modos de vida. Como uma das frentes da Secretaria é a elaboração de protocolos de consulta, a qual é estabelecida pela Convenção 169 da OIT, a SEGAT vê como prioritária a garantia do bem-viver do atingidos pelo rompimento da barragem, pois, apesar de alguns danos serem irreversíveis, a violação não os impede de terem seus direitos territoriais e o direito à consulta assegurados”, estabeleceu Elis.

Segundo Francisco Itamar Gonçalves Melgueiro, coordenador-geral de Gestão Ambiental da FUNAI, o Novo Acordo é uma construção coletiva, ou seja, feita não apenas pelo governo federal, mas principalmente com os indígenas, com a participação de outros órgãos, como o Judiciário, os governos dos estados de MG e ES e várias instituições. “Como MPI e FUNAI, o que garantimos no Acordo foi a possibilidade de os indígenas discutirem e entenderem, principalmente o anexo 3, para que tomem as próprias decisões”.

Fonte: gov.br