Não vou entrar na miudeza da política ou, pior, na despolitização da história. Quero mesmo é tratar da nova geopolítica mundial, que nem é tão nova assim, mas vem tomando conta das disputas internacionais de hoje.

Para entender a política e a economia mundial é imprescindível conhecer duas categorias básicas da economia moderna: Acumulação Primitiva do Capital e Divisão Internacional do Trabalho (DIT). O seu desconhecimento conceitual leva apenas a uma discussão pontual e fora da história, transformando tudo numa torcida de futebol.

Na acumulação primitiva, teoria marxiana desenvolvida em O Capital, você entenderá que riqueza e pobreza das nações não são determinações divinas ou da natureza. Foi se apropriando dos bens de sobrevivência humana, como a terra, que tudo começou, ainda na antiguidade e, posteriormente, na idade média. Um era o senhor dono da terra e o outro, o servo que vivia e trabalhava na terra para seu sustento e sustento do senhor, da sua família e do príncipe.

Não satisfeito, o príncipe guerreava e saqueava outros povos. Mas ainda era pouco e resolveu mandar corsários e exércitos descobrirem novas terras e novos tesouros. Assim chegaram nas Américas e mataram seus povos originários, roubaram suas riquezas (ouro, diamantes, sementes, etc) e escravizaram a gente nativa.

Em linhas gerais, foi isso que levou o mundo de hoje a ter países ricos e países pobres. Os ricos são aqueles que roubaram e traficaram seres humanos; os pobres, são aqueles que foram roubados e escravizados.

Ao contrário do que escreveu Adam Smith em A Riqueza das Nações, não foi a simples troca e a cunhagem de moeda que criou a Divisão do Trabalho. Foi a espoliação, a pilhagem e a escravização.

Dito isso, passemos para o mundo de hoje, onde a acumulação primitiva virou acumulação capitalista.

Alguém acha mesmo que os países ricos, que construíram sua riqueza roubando e escravizando, estão preocupados com o meio ambiente e com a preservação da Amazônia?

Eles querem nossas riquezas, as riquezas naturais da Amazônia, para aumentarem sua riqueza, da mesma forma que se tornaram ricos. Se o governo brasileiro fechar a Amazônia para o capital internacional, para as grandes empresas e conglomerados, nosso país sofrerá sanções econômicas e políticas e golpes serão planejados. Nossa gente passará fome e não terá sequer remédio para curar suas doenças. Milhões de brasileiros migrarão para países vizinhos.

E você, incauto ou ignorante de esquerda ou direita, acha que Estados Unidos e países ricos da Europa estão preocupados com a democracia na Venezuela e que Maduro é o pior dos males? Santa ignorância.

A Venezuela está passeando pela mesma situação da qual Cuba foi submetida há mais de 60 anos, porque deixou de ser um puteiro dos ricaços de Miami. O povo venezuelano está sofrendo 930 sanções econômicas porque seu governo resiste em não entregar seu petróleo para aumentar a riqueza dos países ricos, os mesmos que ficaram ricos, saqueando, matando e escravizando outros povos.

E você acha que se a Venezuela abrir sua reserva de petróleo para os Estados Unidos e seus aliados a vida do povo vai melhorar? A vida dos povos da África, que tiveram seus diamantes roubados, melhorou? Se um ladrão tomar teu carro, tua casa, tua geladeira e tua cama, tua vida vai melhorar?

O povo da Venezuela está certo em não querer entregar seu único bem econômico aos saqueadores. Nós, brasileiros, também não queremos entregar a Amazônia, mas os países ricos vivem ameaçando tomá-la. Talvez alguém ache certo internacionalizar nosso bem maior, mas a história já provou o que acontece com quem é roubado ou saqueado.

O problema não é o Maduro, como não foi o Fidel. O problema está em como o mundo moderno foi construído e organizado. Países ricos continuam querendo aumentar sua riqueza saqueando países que outrora foram saqueados por eles. Resistir é uma forma de se manter vivo. Se deixar derrotar, é a morte.

O povo da Venezuela não tem sequer insulina para cuidar dos seus diabéticos. A comida é difícil, o emprego também. E você, por conta do seu desconhecimento da história ou por ser uma marionete dos meios de comunicação manipulados pelos países ricos, vem dizer que o problema está no governo da Venezuela ou de Cuba, tenha vergonha e vá estudar.

Sete milhões de venezuelanos saíram do seu país. Claro, quem pode sair e procurar vida melhor, que o faça, mas saiba que essa situação do seu país é resultado da imposição daqueles que sempre saquearam bem alheio no mundo todo.

A vida pode e vai melhorar, mas é preciso resistir ao inimigo, como nossos povos originários fizeram. Quem se aliou, morreu. Nunca defenda teu algoz. Vítima não tem culpa.

Lúcio Carril 

Sociólogo

 

 

Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil