Ano de eleição.

Lá vem um indivíduo reclamar dos políticos e da política. Já sei que votou na última eleição e se decepcionou. Pode até mesmo ter vendido o voto ou emprestado a um candidato que lhe prometeu alguma coisa pessoal.

O eleitor é parte indissociável da eleição, assim como o candidato, o partido, o voto e o órgão de Estado responsável pelo pleito. Todos formam o sistema eleitoral e são imprescindíveis para a democracia. Não podem existir sozinhos, pois precisam de interação e interconexão para dar sentido à sua existência.

Mas se há um desses institutos com maior peso é o eleitor, enquanto indivíduo autônomo e responsável pela legitimação democrática de toda eleição. É da escolha dele que se edifica a representação.

O problema é que esse sujeito coletivo não se reconhece como força motriz do processo eleitoral e transforma sua participação num negócio de vantagem e desvantagem individual, sem ver na política uma saída coletiva para suas expectativas pessoais. Assim o eleitor se torna um átomo sem reconhecimento dos seus prótons e elétrons.

Seria o eleitor um algoz dele mesmo na democracia? Claro que não.

A história política do Brasil não proporcionou a criação de um eleitorado consciente da sua força. Aqui a democracia foi vilipendiada por golpes e mais golpes. Nunca chegou sequer à adolescência. Ainda na sua primeira infância foi violentada por interesses da chamada elite econômica e política. As oligarquias nunca deixaram a democracia amadurecer.

Sem democracia não é possível ter um povo que reconheça sua força. E tudo vira um negócio, como nos tempos dos coronéis de barranco que tratavam as famílias de seus empregados como gado marcado. O voto fazia parte do emprego e da esmola.

Esse eleitorado persiste. É ele que não reconhece na política o preço do pão e da carne e considera todo político um desonesto dissociado do seu voto, havendo assim uma relação promíscua que faz do voto apenas uma oportunidade de troca individual, seja ela uma oferta de arma liberada ou um rancho de alimentos.

O eleitor de hoje é resultado de um processo histórico autoritário, que não permitiu que a democracia formasse uma massa crítica de cidadãos e cidadãs. A chamada politicagem nasce daí e não do candidato ou do político, isoladamente. Até porque mesmo que não se vejam assim, interagem numa interconexão alienada e alienante.

 

 

Lúcio Carril 

Sociólogo

Foto: FREEPIK